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Fim da publicidade infantil: marco histórico para a infância brasileira

07/05/2014

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Resolução delimita o que agora é considerado abusivo no âmbito da publicidade e da comunicação mercadológica em relação às crianças.

Por Isabella Henriques*

No último mês de abril, a história dos direitos da criança no Brasil deu um importante salto em direção à garantia de uma infância plena, sadia e feliz. Isso ocorreu por força da Resolução nº 163 emanada pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que passou a considerar abusiva toda e qualquer publicidade ou comunicação mercadológica dirigida ao público menor de 12 anos de idade.

Ao tomar essa decisão, o conselho resolveu uma discussão que já durava alguns anos, não só no âmbito dos tribunais pátrios ou perante órgãos de defesa do consumidor, mas também entre o mercado publicitário e as organizações de defesa dos direitos da criança e do adolescente.

Pelo menos desde 2001, quando foi proposto o primeiro projeto de lei visando proibir por completo a publicidade de produtos infantis – posteriormente modificado para sugerir a proibição do direcionamento de publicidade para crianças –, a discussão instaurou-se no país. Já naquela oportunidade, organizações da sociedade civil ligadas à causa da infância apoiavam a iniciativa e denunciavam o massacre ao qual estavam sendo submetidas as crianças brasileiras por conta dos anúncios publicitários.

Em meados de 2006, foi realizado o I Fórum Internacional Criança e Consumo, organizado pelo Instituto Alana, com o objetivo de promover a reflexão sobre a publicidade infantil. Ao final daquele ano, sobreveio a nova regra do Reino Unido proibindo publicidade de produtos alimentícios com altos teores de sódio, gorduras trans e saturadas e açúcar durante programação televisiva cuja audiência fosse de um público menor de 16 anos de idade.

Esses fatos, somados a uma já intensa mobilização social, fizeram a própria associação do mercado publicitário, o Conar, tradicionalmente reticente a qualquer restrição da publicidade, criar novas regras em seu Código de Autorregulamentação Publicitária, no sentido de dar maior proteção às crianças.

Em 2009, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) promoveu a RDC nº 24, determinando que as publicidades de alimentos obesogênicos fossem acompanhadas de alertas informativos, foi a vez de outras associações de classe – a Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) e a Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (Abia) – fazerem suas concessões, promovendo a assinatura de um compromisso corporativo com as grandes empresas do setor de alimentos, com o escopo de proteger as crianças dos abusos publicitários.

No entanto, até a publicação da Resolução nº 163 do Conanda, nenhuma das iniciativas mencionadas havia efetivamente surtido algum efeito. O projeto de lei referido acima permanece tramitando no Congresso Nacional há mais de 12 anos, enquanto a citada RDC nada abordou sobre a infância – ainda que seu texto preliminar tivesse tal alcance.

Da mesma forma, a autorregulamentação do Conar nunca conseguiu responder aos anseios da sociedade em prol da infância – mesmo tendo se pronunciado recentemente contra qualquer tipo de merchandising voltado aos pequenos. Também o compromisso das grandes do setor alimentício, por conta de seu texto cheio de exceções e permissões, nunca teve o efeito proposto. Isso sem falar que, no Brasil, essas chamadas autorregulações não são fiscalizadas nem auditadas por quem quer que seja.

É por isso que a já vigente resolução, um ato normativo emanado de um Conselho de Direitos, que tem caráter vinculante e deve, obrigatoriamente, ser observado e cumprido em todo o território nacional, inaugura um novo marco na história dos direitos humanos da criança no país.

A resolução delimita o que agora é considerado abusivo no âmbito da publicidade e da comunicação mercadológica em relação às crianças. Dessa forma, o aplicador da norma terá como se apoiar no artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor – que efetivamente traz a proibição da publicidade abusiva –, juntamente com os termos da Resolução nº 163.

Na prática, isso deveria significar o fim dos abusos mercadológicos desferidos às crianças, ou seja, o fim do direcionamento da publicidade ao público infantil. Como, infelizmente, não é isso que se nota, caberá aos órgãos da administração e ao Poder Judiciário coibir as ilegalidades cometidas, inclusive com a aplicação das respectivas sanções.

As punições serão evitadas se as empresas, conscientes do seu papel na sociedade e dotadas de responsabilidade social empresarial, passarem a cumprir o que determina o arcabouço jurídico brasileiro e deixarem de promover seus produtos e serviços diretamente ao público infantil, participando, assim, da construção de um país que verdadeiramente honre suas crianças.

* Isabella Henriques diretora no Instituto Alana e coordenadora-geral do Projeto Criança e Consumo.

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Este texto faz parte da série de artigos de especialistas promovida pelo Instituto Ethos com o objetivo de subsidiar e estimular as boas práticas de gestão.

Veja também:
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– Relacionamento com partes interessadas, de Regi Magalhães;
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– O princípio da transparência no contexto da governança corporativa, de Lélio Lauretti;
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– Sustentabilidade na cadeia de valor, de Cristina Fedato;
– Métodos para integrar a responsabilidade social na gestão, de Jorge Emanuel Reis Cajazeira e José Carlos Barbieri;
– Generosidade: o quarto elemento do triple bottom line, de Rogério Ruschel;
– O que mudou na sustentabilidade das empresas, de Dal Marcondes;
– Responsabilidade social empresarial e sustentabilidade para a gestão empresarial, de Fernanda Gabriela Borger;
– Os Dez Mandamentos da empresa responsável, de Rogério Ruschel;
– O RH como alavanca da estratégia sustentável, de Aileen Ionescu-Somers;
– 
Marcas globais avançam na gestão de resíduos sólidos, de Ricardo Abramovay;
– Inclusão e diversidade, de Reinaldo Bulgarelli;
– Da visão de risco para a de oportunidade, de Ricardo Voltolini;
– Medindo o bem-estar das pessoas, de Marina Grossi;
– A quantas andam os Objetivos do Milênio, de Regina Scharf;
– Igualdade de gênero: realidade ou miragem?, de Regina Madalozzo e Luis Cirihal;
– Interiorização do Desenvolvimento: IDH Municipal 2013, de Ladislau Dowbor;
– Racismo ambiental: derivação de um problema histórico, de Nelson Inocêncio;
– Procuram-se líderes da sustentabilidade, de Marina Grossi e Marcos Bicudo;
– Relato integrado: evolução da comunicação de resultados, de Álvaro Almeida;
– A persistência das desigualdades raciais no mundo empresarial, de Pedro Jaime;
– A agropecuária e as emissões de gases de efeito estufa, de Marina Piatto, Maurício Voivodic e Luís Fernando Guedes Pinto;
– Gestão de impactos sociais nos empreendimentos: riscos e oportunidades, de Fábio Risério, Sérgio Avelar e Viviane Freitas;
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– Executivos negros e movimento antirracista no Brasil, de Pedro Jaime;
– Lixo: marchas e contramarchas de um debate fundamental, de Maurício Waldman;
– Contribuições da certificação socioambiental para a sustentabilidade da citricultura brasileira, de Por Luís Fernando Guedes Pinto, Daniella Macedo, Alessandro Rodrigues e Eduardo Augusto Girardi;
– Entre o 2 e o 3, existe o 2,5, de Rafael Morais Chiaravalloti;
– Trabalho longe de casa, de Marina Loyola;
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